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Tarefas:

1 - Lê atentamente o conto Dom Caio

2 - Responde ao questionário online.

D. Caio

 

Era um alfaiate muito poltrão, que estava a trabalhar à porta da rua. Como tinha medo de tudo, o seu gosto era fingir-se de valente. Vai de uma vez viu muitas moscas juntas e de uma pancada matou sete. Daí em diante não fazia senão gabar-se:

— Eu cá mato sete de uma vez!

Ora o rei andava muito aparvalhado, porque lhe tinha morrido na guerra o seu general Dom Caio, que era o maior valente que havia, e as tropas do inimigo já vinham contra ele, porque sabiam que não tinha quem mandasse combatê-las.

Os que ouviram o alfaiate andar a dizer por toda a parte: «Eu cá mato sete de uma vez!» foram logo metê-lo no bico do rei, que se lembrou de que quem era assim tão valente seria capaz de ocupar o posto de Dom Caio.

Veio o alfaiate à presença do rei, que lhe perguntou:

— É verdade que matas sete de uma vez?

— Saberá Vossa Majestade que sim.

— Então, nesse caso, vais comandar as minhas tropas e atacar os inimigos que me estão cercando.

Mandou vir o fardamento de Dom Caio e fê-lo vestir ao alfaiate, que era muito baixinho, e que ficou com o chapéu de bicos enterrado até às orelhas; depois disse que trouxessem o cavalo branco de Dom Caio para o alfaiate montar. Ajudaram-no a subir para o cavalo, e ele já estava a tremer como varas verdes; assim que o cavalo sentiu as esporas botou à desfilada, e o alfaiate a gritar:

— Eu caio, eu caio!

Todos os que o ouviam por onde passava diziam:

— Ele agora diz que é o Dom Caio; já temos homem.

O cavalo, que andava acostumado às escaramuças, correu para o sítio em que se combatia, e o alfaiate com medo de cair ia agarrado às crinas, a gritar como um desesperado:

— Eu caio, eu caio!

O inimigo, assim que viu o cavalo branco do general valente e ouviu o grito: «Eu caio, eu caio!», conheceu o perigo em que estava, e disseram os soldados uns para os outros:

— Estamos perdidos, que lá vem o Dom Caio; lá vem o Dom Caio.

E botaram a fugir à debandada; os soldados do rei foram-lhes no encalço e mataram-nos. O alfaiate ganhou assim a batalha só em agarrar-se ao pescoço do cavalo e em gritar: «Eu caio».

O rei ficou muito contente e, em paga da vitória, deu-lhe a princesa em casamento, e ninguém fazia senão louvar o sucessor de Dom Caio pela sua coragem.

 

BRAGA, Teófilo – Contos tradicionais do povo português. Dom Quixote, 2002.

 

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